Mais de 20 mil funcionários, cerca de 1% da força de trabalho federal dos Estados Unidos, se inscreveram para uma oferta de demissão em troca de um acordo. O plano faz parte da agenda de cortes de Elon Musk, que promete reduzir custos e reformular a administração federal americana. O empresário espera que a medida elimine até 10% da força de trabalho federal, de 2,3 milhões de servidores.
A proposta, que pode ser aceita até quinta-feira, 6, estabelece que eles deixem seus empregos até o final de fevereiro, tendo salários garantidos até o final de setembro. Eles também precisam concordar em não processar o governo.
Uma pessoa próxima a Musk, ouvida pelo The Wall Street Journal, comparou o presidente-executivo da Tesla a Dick Cheney, vice-presidente durante o governo George W. Bush, considerado a pessoa mais poderosa para ocupar o cargo devido ao seu acesso ao presidente e seu conhecimento de como o governo federal operava. Fontes do governo ouvidos pelo New York Times afirmam que Musk é visto como alguém que opera com um nível de autonomia que quase ninguém pode controlar.
Ele recebeu de Trump o comando do Serviço Digital dos Estados Unidos (USDS, na sigla em inglês), criado em 2014 para atualizar e organizar os serviços on-line do governo americano — rebatizado como Serviço Doge dos EUA. A equipe, em pouco mais de duas semanas, ganhou acesso aos sistemas do Departamento de Recursos Humanos do governo federal e ao sistema de pagamento do Tesouro, uma ferramenta poderosa para monitorar e potencialmente limitar os gastos do governo. O que levantou uma série de preocupações.
O megaempresário fez tudo isso sem se afastar de suas funções na rede social X, na Tesla e na Space X. De acordo com apuração do Wall Street Journal, ele foi designado como “funcionário especial do governo”, um status temporário, que o permite trabalhar na Casa Branca por 130 dias sem preencher formulários de divulgação financeira.
Trump também concedeu a Musk poder sobre a burocracia que regula suas próprias empresas e concede contratos a elas. O bilionário também tem peso nas decisões de indicações políticas, tendo apontado Troy Meink como secretário da Força Aérea, de acordo com três pessoas com conhecimento direto da função. Meink chefiou anteriormente um escritório do Pentágono, que ajudou Musk a garantir um contrato multibilionário para a SpaceX ajudar a construir e implantar uma rede de satélites espiões para o governo federal.
Não há precedente de um funcionário do governo com a quantidade de possíveis conflitos de interesse de Musk, que possui participações nacionais e conexões estrangeiras, como relações comerciais na China. E não há precedente para alguém que não seja um funcionário em tempo integral ter tal capacidade de remodelar a administração federal. Trump, porém, garante que essa é uma situação que está sob controle.
“Se houver um conflito [de interesses], não o deixaremos chegar perto”, disse Trump, sem detalhar quem exatamente bloquearia Musk quando necessário, ou se ele foi impedido de atuar em qualquer parte do governo até agora.
Ferramenta útil
Musk vem desempenhando um papel mais eficaz do que assessores do círculo interno do presidente acreditavam. Com agências que o Partido Republicano pressionava na mira, ele obteve acesso a importantes sistemas financeiros e de dados, entrou em disputa com funcionários de carreira e usou uma série de táticas, incluindo intimidação e uma espécie de exposição on-line para prevalecer.
Uma fonte ouvida pelo jornal americano Washington Post afirmou que as ações do bilionário não são monitoradas de perto pelo presidente, mas que o republicano vê o aliado como alguém que cumpre o papel que lhe foi designado. Trump também avaliaria como positivo o fato de outra pessoa assumir a frente em determinadas medidas impopulares, sem que ele sofra o desgaste.
Tentativas de contenção
As promessas do presidente não acalmaram democratas e servidores públicos que veem na atuação de Musk um risco institucional. Ao menos quatro ações judiciais foram movidas em um tribunal federal para contestar a autoridade do bilionário e as ações da nova administração, mas ainda não se sabe se a revisão judicial pode acompanhar o Sr. Musk.
O New York Times falou com mais de trinta funcionários atuais e antigos da administração federal dos EUA, funcionários federais e pessoas próximas a Musk, que descreveram sua influência crescente sobre o governo federal. Poucos estavam dispostos a falar oficialmente, por medo de retaliação.
“Antes que o Congresso e os tribunais possam responder, Elon Musk terá fechado todo o governo”, disse um funcionário que trabalha dentro de uma agência onde representantes da iniciativa de corte de custos de Musk afirmaram ter tomado o controle.
Musk, por sua vez, diz que está fazendo reformas há muito esperadas. Até agora, sua equipe afirmou ter ajudado o governo federal a economizar mais de US$ 1 bilhão por dia por meio de esforços como o cancelamento de arrendamentos de edifícios federais e contratos relacionados à diversidade, equidade e inclusão, embora tenham fornecido poucos detalhes.
Seus aliados agora também pretendem injetar ferramentas de inteligência artificial em sistemas governamentais, usando-as para avaliar contratos e recomendar cortes. Na segunda-feira, Thomas Shedd, um ex-engenheiro da Tesla que foi escolhido para liderar uma equipe de tecnologia na Administração de Serviços Gerais, disse a alguns membros da equipe que esperava colocar todos os contratos federais em um sistema centralizado para que pudessem ser analisados por inteligência artificial, disseram três pessoas familiarizadas com a reunião.
*Com O Globo.
Fonte: Exame