A música popular brasileira vem ganhando uma nova cara: jovem, conectada e politicamente engajada. Dados do Spotify mostram que, entre 2022 e 2024, o consumo de MPB cresceu 47%, sendo que 64% desse aumento veio de ouvintes da Geração Z, com idades entre 18 e 24 anos. Hoje, esse grupo representa 25,1% de toda a audiência de MPB na plataforma, destacando-se como o único segmento etário a registrar crescimento expressivo.
Para especialistas, o fenômeno vai além da nostalgia. “A primeira razão é a facilidade do acesso à música. Antigamente, para ouvir um álbum do Caetano da década de 70, eu teria que sair de casa, comprar o disco e tocar em ordem. Hoje, com o streaming, você tem todo o catálogo à disposição. Isso facilita muito o contato das novas gerações com a obra desses artistas”, explica Gustavo Vaz, artista e criador de conteúdo, ao Metrópoles.
O impacto das redes sociais também é significativo. Segundo Vaz, plataformas de vídeos curtos transformam músicas antigas em trends que dialogam diretamente com a Geração Z.
Foi o que aconteceu, recentemente, com o hit Espera Pra Ver, de Evinha. A faixa do álbum Cartão Postal, lançadon em 1971, foi resgatado por internautas em trends cresceu também em consumo no streaming. Entre 27 de janeiro e 7 de fevereiro, foi registrado no Spotify um crescimento de 250% no consumo diário da canção.
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“O principal elo é a capacidade desses artistas de escrever coisas atemporais. MPB é música de canção, e o Brasil ama canção. As letras ainda reverberam hoje e refletem muito sobre a sociedade em que vivemos”, afirma.
A fusão da MPB com outros gêneros também contribui para a aproximação com os jovens. “O rap e o trap, especialmente através de samples, têm trazido um novo olhar para clássicos da MPB. O funk e outros ritmos ajudam a projetar artistas antigos para novas gerações. Esse diálogo aproxima o passado e o presente e mostra que a MPB continua viva”, destaca Luca Bonchristiano, sócio da produtora e gravadora Head Media.
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Após morte de Preta, Gilberto Gil anuncia data para retomar sua turnê
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Evinha
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Chico Buarque
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Maria Bethânia
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Djavan
Instagram/Reprodução
Engajamento político
O engajamento político de artistas consagrados da MPB também reforça a relevância do gênero para os mais jovens. Segundo pesquisa recente da AP Exata, 44,5% das pessoas de 16 a 18 anos se consideram de esqueda, assim como 33,7% dos que na faixa entre os 19 e 24 anos.
Em setembro, de setembro, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico Buarque, Djavan e outros artistas participaram de manifestações contra a PEC da Blindagem e a anistia dos envolvidos nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro e levaram multidões às ruas das capitais brasileiras.
Paulo Ramirez, cientista político da ESPM, lembra que a MPB sempre dialogou com movimentos sociais: “Parte da população tem resgatado símbolos favoráveis à democracia. A MPB foi e continua sendo um instrumento de luta política, e os jovens percebem isso.”
O movimento se reflete também nos artistas contemporâneos. “Existem músicos atuais que se engajam em shows e nas ruas, criticando ações arbitrárias contra a democracia. Isso reforça a importância da MPB como voz política, e os jovens acompanham de perto”, completa Ramirez.
Caetano Veloso, Djavan, Chico Buarque e Gilberto Gil cantam em protesto contra PEC da Blindagem – Metrópoles
Nova MPB
A nova fase da MPB não ignora os clássicos, mas dialoga com o contemporâneo. Nomes como Ana Vitória e Liniker, por exemplo, se misturam a ícones atemporais como Djavan, Chico Buarque e Tim Maia nos dados oferecidos pelo Spotify.
Sobre a nova geração de músicos que vem se inserindo na MPB, Gustavo Vaz defende que o conceito de “nova MPB” não indica ruptura, mas sim evolução. “A MPB abarca várias formas de composição. As gerações atuais têm sua própria identidade, timbres diferentes e preocupações novas. Sempre será algo novo, mesmo bebendo dos grandes mestres”, garante.
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Liniker
Larissa Kreili/@liniker/Instagram/Reprodução2 de 5
Rachel Reis
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Tim Bernardes
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AnaVitória
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Rubel
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Bonchristiano reforça que o gênero está em constante transformação: “Não é apenas uma releitura. Os novos artistas misturam MPB com trap, funk e referências internacionais. Há atualização de linguagem, temas e forma de ver o mundo. É uma nova fase viva e pulsante da música brasileira”.
Para o futuro, a expectativa é que a MPB continue absorvendo influências de diferentes ritmos. O hip hop, o funk, o piseiro e outros estilos brasileiros já dialogam com a MPB, mantendo sua essência ao mesmo tempo em que se atualizam. “A MPB sempre reflete o que o povo escuta. Ela se transforma e se reinventa, mas segue sendo MPB”, conclui Luca Bonchristiano.