Como já foi decidido pelo Tribunal Superior Eleitoral (REspe 19.392), para que os candidatos beneficiados por fraude na cota de gênero percam seus diplomas, não é necessária prova indiscutível da participação ou concordância de todos.
Assim, a 96ª Zona Eleitoral de Bela Cruz (CE) anulou todos os votos recebidos pelo partido Progressistas (PP) nas eleições municipais do último ano e os diplomas ou registros dos candidatos eleitos e suplentes.
O juiz Gustavo Farias Alves ainda determinou a retotalização dos votos e a redistribuição das vagas de vereadores no município.
Também foi estipulada inelegibilidade por oito anos para as duas candidatas laranjas do PP no município e para o presidente do diretório municipal, que concorreu ao cargo de prefeito, mas não foi eleito.
Driblando o pleito
O Ministério Público Eleitoral propôs a ação contra os diretórios municipal e estadual do PP, o candidato do partido ao cargo de prefeito nas eleições de 2024, o candidato a vice-prefeito, diversos vereadores eleitos ou suplentes e dirigentes partidários.
A acusação era de fraude à cota de gênero e abuso de poder político, devido ao registro de candidatas fictícias com o objetivo de cumprir a cota de gênero mínima de 30% para candidaturas de cada sexo nas eleições proporcionais.
A legenda formulou o pedido de 14 registros de candidaturas em Bela Cruz, entre as quais cinco eram de mulheres — ou seja, o número mínimo exigido.
De acordo com o MPE, duas candidaturas femininas eram fictícias, pois, desde o início, as duas mulheres apresentadas pelo PP não tinham qualquer intenção ou vontade de concorrer às eleições.
Já o partido alegou que elas abriram contas bancárias de suas campanhas e promoveram suas candidaturas durante todo o período de campanha, por meio de reuniões, comícios, caminhadas, carreatas, visitações e confecção de santinhos.
Campanhas fictícias
Com base nos documentos apresentados pelas partes e nos dados dos processos de prestação de contas, Alves concluiu que as alegações da defesa eram frágeis.
Ele ressaltou que as duas candidatas em questão tiveram votação inexpressiva: uma média de sete votos por candidata, enquanto as candidaturas masculinas tiveram média de 217 votos.
Uma das candidatas apontadas pelo MPE é sogra do presidente do diretório municipal do PP, que concorreu à prefeitura. “As candidatas se preocuparam muito mais em fazer campanha e participar de propaganda eleitoral em prol dele”, indicou o juiz.
Nenhuma das candidatas recebeu doações do partido e sua movimentação financeira foi “irrelevante”. Uma delas recebeu apenas R$ 120, enquanto a outra recebeu R$ 103,50. Em ambos os casos, o dinheiro veio do candidato a prefeito.
Devido à grande votação obtida pelas candidaturas masculinas, todos os candidatos do PP à Câmara Municipal foram proclamados eleitos ou suplentes — inclusive as candidatas laranjas, como suplentes. Por isso, Alves considerou que a fraude à cota de gênero “teve potencialidade para lesionar a lisura do pleito eleitoral”.
A inelegibilidade foi imposta ao presidente do diretório municipal por ter atuado “decisivamente para viabilizar a fraude”. Foi ele quem homologou a indicação dos nomes das duas candidatas fictícias na convenção partidária.
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Processo 0600355-50.2024.6.06.0096
Fonte: Jornal Pequeno