Veja como a nova política de preços da Petrobras afeta o consumidor

A Petrobras anunciou, na terça-feira passada, 16, uma nova política de preços. Com a mudança, a estatal petrolífera deixa de utilizar a política de preço de paridade de importação (PPI), instituída em 2016, como única referência para a venda de gasolina e diesel para as distribuidoras.

A medida atende uma promessa de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que havia se comprometido a “abrasileirar” os preços dos combustíveis. Horas depois, a Petrobras anunciou também redução em R$ 0,44 por litro do preço médio do diesel para as distribuidoras, que passou de R$ 3,46 para R$ 3,02. Já o preço médio da gasolina para as distribuidoras foi reduzido em R$ 0,40 por litro, passando de R$ 3,18 para R$ 2,78. O preço do botijão de 13 quilos de gás para as distribuidoras caiu, em média, R$ 8,97.

O repasse desses cortes para os consumidores depende, porém, das distribuidoras e dos postos de combustíveis. De acordo com economistas ouvidos pela DW Brasil, a nova política de preços da Petrobras deverá amortecer o impacto dos preços dos combustíveis no índice de inflação nacional, o IPCA.

Segundo os especialistas, isso não significa, a priori, uma interferência direta do governo nos valores do diesel e da gasolina, mas um amortecimento dos impactos das variações internacionais do preço do petróleo e do dólar na cesta de consumo da população.

Gasolina acima de R$ 8
No regime PPI, implementado no governo do presidente Michel Temer (MDB), os preços dos combustíveis ficavam basicamente atrelados às cotações internacionais e ao custo do frete, que também podia sofrer variações com a flutuação do câmbio.

Em seis anos de paridade internacional, a média do litro da gasolina foi de R$ 3,66, em outubro de 2016, até R$ 5,51 no último mês, de acordo com dados da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do Brasil (ANP). A alta, de cerca de 50%, foi maior que a do IPCA no período, de 40%. Além disso, o litro chegou a ultrapassar R$ 8 durante alguns meses de 2022.

Segundo o professor de economia Breno Roos, da UFRN, a política de PPI foi incorporada num princípio de abertura de mercado defendida pelos governos anteriores, que incluía também a venda de refinarias, por exemplo. Com isso, os preços comercializados nas refinarias da Petrobras eram praticamente os mesmos das refinarias privadas, já que não se levava em consideração a produção do petróleo no Brasil.

“Era como se o Brasil fosse um país com nenhum petróleo, que importasse tudo. O resultado disso foi que, quando houve um choque lá fora, no período mais crítico da pandemia, quando o petróleo ultrapassou os 110 dólares, nós importamos a inflação, repassando integralmente o custo dos derivados no mercado internacional e do câmbio desvalorizado”, diz Roos, acrescentando que a atual política de juros do Banco Central, que é criticada pelo governo federal, foi uma consequência direta dos choques de preço nos combustíveis.

Para ele, o Brasil está no meio termo internacional dos países produtores de petróleo na prática de preços. Enquanto “petroestados”, como Arábia Saudita e Venezuela, por exemplo, subsidiam combustíveis e os vendem mais abaixo do custo de produção, a empresa brasileira alia lucratividade com referência no mercado internacional.

Já os Estados Unidos, país que é o maior produtor de petróleo do mundo, utilizam o PPI, mas a regra é justificada pelo mercado competitivo do país. “São mais de 2 mil refinarias por lá, que são grandes, comercializam para fora e concorrem entre si”, diz. O Brasil, por sua vez, tem 17 refinarias de petróleo, com 13 delas pertencentes à Petrobras.

Novos parâmetros
No comunicado sobre a nova estratégia comercial de diesel e gasolina, a Petrobras diz que vai levar em consideração, a partir de agora, referências como o “custo alternativo do cliente” e o “valor marginal para a empresa”.

De acordo com a estatal, o primeiro ponto leva em consideração as “principais alternativas de produtos ou de produtos substitutos”, ou seja, o valor de gasolina e diesel em refinarias que não sejam da Petrobras ou até mesmo de etanol e biocombustível em usinas. Já o valor marginal da empresa, segundo Roos, sinaliza a implementação de uma estratégia regional, que pode inclusive levar à cobrança de preços diferentes em regiões diferentes, de acordo com o local. “Pode ser que, em uma região, ela prefira importar a vender”, diz.

“É uma perspectiva interessante, porque traz uma realidade de mercado, de competitividade e de lucratividade à empresa”, pontua a professora de economia Cristina Helena Pinto de Mello, da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). Segundo ela, a implementação do PPI, que tentava impedir interferências de preços por parte do governo, acabou por criar uma rigidez de regras, com volatilidade. “Precisamos ver como essa nova política vai ser operacionalizada. Mas, pela atual composição do conselho e pelo perfil da presidência, acredito que vá ser uma regra saudável”, complementa.

Cofres públicos e juros básicos
Por outro lado, durante a vigência do PPI, a Petrobras teve lucro recorde, que foi distribuído para acionistas por meio de dividendos. Os resultados saltaram de um prejuízo de R$ 14,8 bilhões em 2016 para um lucro de R$ 188,3 bilhões em 2022. No ano passado, foram distribuídos R$ 215,7 bilhões a acionistas. Parte desse valor retornava para o tesouro do governo federal, que é o principal acionista da estatal, com cerca de 36% das ações.

No entanto, segundo Roos, essa política, do ponto de vista macroeconômico, acabou virando um “tiro no pé” do próprio governo. “Se a empresa pagou muito dividendo para o governo, mas [os valores dos combustíveis] pressionaram muito a inflação, acabou-se obrigando, pela forma de atuação do Banco Central, a elevar a taxa de juros. Isso aumenta o custo da dívida e exige um esforço fiscal muito grande, travando a economia”, afirma o economista da UFRN.

Para Mello, da ESPM, a flexibilidade da nova regra de preços da estatal não implica redução de lucro. Com o PPI, acrescenta ela, produtos substitutos, como o etanol, podem ficar mais competitivos que a gasolina, por exemplo, causando uma redução de demanda. “Muitas vezes, uma redução de preço [da gasolina e do diesel] pode vir acompanhada de um aumento mais significativo nas vendas, com um resultado melhor. Além disso, se houver um impacto no IPCA, isso cria espaço para redução dos juros, e isso traz alívio para as contas públicas”, diz ela.

A redução no IPCA, no entanto, dependerá do impacto que o retorno da cobrança de impostos como o ICMS estadual, que foi retirado durante a do ano passado, vai causar nos preços.

Além disso, afirma Roos, a nova política de preços não necessariamente significará que a Petrobras vai represar possíveis novos choques de petróleo no mercado internacional. “Mas a empresa vai acabar suavizando esses repasses do mercado internacional, mesmo porque a maior parte dos custos dela é em reais. Ela pode fazer isso”, afirma o economista. “Agora, choques muito graves terão de ser repassados, mesmo porque a empresa tem várias regras de governança, está na Bolsa de Valores. Não vai ser possível ocorrer o que houve em 2014, com o preço do petróleo acima de 100 dólares e a gasolina a R$ 2”, conclui.

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