Qual o real poder da autodemissão?

Já ouviu falar em autodemissão? Tenho uma amiga, na casa dos seus 40 e poucos anos que, depois de trabalhar por mais de uma década e meia em uma agência de publicidade, decidiu sair do emprego para empreender. Conversando com ela um dia desses, essa amiga me confidenciou que a autodemissão foi a melhor forma que ela encontrou de “se libertar da rotina cansativa e realizar o sonho de ter o próprio negócio”.

Essa conversa me fez refletir, obviamente ninguém é obrigado a ficar em um lugar em que não se sente bem ou que não te permite alcançar os seus objetivos, ainda mais quando se trata de trabalho. No entanto, não é tão simples levantar um dia e decidir pedir as contas. Pedir demissão é um ato de coragem.

Conhecida como autodemissão, “quit job” e ou “self-resignation”, essa prática ocorre quando uma pessoa decide voluntariamente abandonar o seu emprego sem ter sido demitido ou pressionado pela empresa para tomar essa atitude. Esse fenômeno vem crescendo muito nos últimos anos, entre setembro e outubro de 2021, 8,5 milhões de americanos pediram demissão no mesmo momento em que a criação de novas vagas continuava elevada.

O mesmo aconteceu na França, Índia, Reino Unido, Alemanha e . Lá fora, esse fenômeno recebeu o nome de “Great Resignation” (Big Quit ou Great Reshuffle também são usados), algo como Grande Debandada ou a Grande Renúncia, em uma tradução livre para o português.

No Brasil não foi diferente. Desde o ano passado milhares pessoas estão se autodemitindo, em várias áreas e segmentos. Mas, por que isso está acontecendo?

Os motivos são vários:

Primeiro que a pandemia tem uma parcela de culpa. Ela trouxe o isolamento social e com isso o home office ganhou força. Essa nova forma de trabalho fez com que muitos profissionais passassem a enxergar a vida de uma forma diferente, valorizando mais o tempo livre e a qualidade de vida.

Muitos também perceberam que o emprego anterior não era tão importante assim e que poderiam buscar outros caminhos para alcançar seus objetivos e dentro desse contexto é comum encontrarmos cada vez mais pessoas se questionando sobre o que é o trabalho, qual a importância disso na vida como um todo, quais trocas estão dispostas a fazer para continuarem no emprego e quais são os seus limites.

Existe também o caso de pessoas que buscam um novo desafio profissional, outras que querem investir em um projeto pessoal, enquanto algumas simplesmente querem ter mais tempo livre e estão buscando um equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. Uma pesquisa realizada pela Catho, uma das maiores empresas de recrutamento do Brasil, mostrou que 59,4% dos entrevistados deixaram o emprego atual para buscar algo que realmente gostassem de fazer.

Outros fatores que motivam uma pessoa a se demitir pode ser o próprio ambiente de trabalho. Ainda temos no mercado muitas empresas que têm uma cultura tóxica, com sobrecarga de seus colaboradores, falta de reconhecimento ou situações de assédio moral e abuso de poder dentro do ambiente corporativo, o que gera insegurança e insatisfação dentro da organização.

A insatisfação é um dos fatores que mais contribuem para a autodemissão afetando especialmente os jovens da Geração Z. É importante ressaltar que a autodemissão pode acabar sendo benéfica tanto para o profissional quanto para a empresa, independente do motivo que levou o colaborador a tomar essa decisão.

Quando o profissional deixa o emprego para buscar algo melhor, ele pode se desenvolver e adquirir novas habilidades, o que pode ser útil para o mercado de trabalho em geral. Em contrapartida, a empresa pode perceber que precisa melhorar em determinados aspectos, como no reconhecimento e a valorização dos funcionários, por exemplo, e aperfeiçoar seus processos para reter seus talentos.

Também vale lembrar que a autodemissão nem sempre é uma escolha fácil. Tenho  certeza que minha amiga não tomou essa decisão do dia para a noite. Foi algo pensado, calculado, analisado. Porque se autodemitir é ter a consciência de que você renunciará a sua estabilidade, mesmo que por pouco tempo, para assumir riscos e buscar algo novo. E esse processo também pode gerar muita insegurança e incerteza em relação ao futuro.

Autoliderança como ferramenta de motivação e impulsionamento profissional

Costumo dizer que é importante que as pessoas que escolhem se demitir estejam preparadas para enfrentar os desafios que esse caminho apresenta. Uma maneira de facilitar este processo, de forma que, quando o profissional decidir deixar o emprego atual, ele esteja pronto para assumir a responsabilidade por sua carreira e pelas decisões que irá tomar depois da demissão é desenvolver a autoliderança.

Esse termo está ligado à capacidade de liderar a si próprio, ou seja, de tomar decisões e conduzir a sua vida de forma consciente e proativa. Isso inclui a capacidade de identificar as próprias necessidades, se conhecer, identificar suas fraquezas e pontos a serem melhorados, além de buscar diferentes maneiras de encontrar sua realização pessoal e profissional.

Não é à toa que a autoliderança é uma competência cada vez mais valorizada no mercado de trabalho. Segundo pesquisa realizada pela consultoria ManpowerGroup, 77% dos empregadores afirmam que a autoliderança é uma habilidade fundamental para os profissionais. Ou seja, as pessoas que conseguem se liderar, têm mais chances de sucesso na carreira, porque abandonam as desculpas e assumem a responsabilidade por seus próprios resultados.

Mas afinal, como liderar a si próprio?

No caso da autodemissão, a primeira atitude de um líder de si mesmo é definir claramente seus objetivos e metas. Antes de tomar qualquer decisão, é preciso ter um plano bem estruturado em mente. Pergunte-se: qual é o meu objetivo profissional? O que eu quero alcançar a curto, médio e longo prazo? Uma vez que você tenha essas respostas, fica mais fácil decidir se a autodemissão é o melhor caminho para alcançar seus objetivos.

Outra dica importante é ter disciplina e foco. A autodemissão pode parecer uma escolha fácil, mas exige muita disciplina e planejamento. É preciso estar disposto a trabalhar duro para atingir seus objetivos, mesmo que isso signifique sacrificar algumas coisas no curto prazo.

Além disso, outro ponto fundamental para se autodemitir é superar os medos e crenças limitantes. Muitas vezes, a falta de coragem para tomar decisões importantes pode ser um grande obstáculo na hora de deixar o emprego. Por isso, é preciso trabalhar na construção da autoconfiança e da resiliência.

Cercar-se de pessoas que apoiam nossos objetivos e sonhos é igualmente importante no decorrer de todo o processo. Contar com uma rede de apoio forte e positiva pode ser fundamental na hora de tomar decisões difíceis que podem mudar nossas vidas.

Por fim, para desenvolver a capacidade da autoliderança e ir atrás dos seus objetivos, é preciso assumir a responsabilidade por seus próprios resultados e ser proativo na busca por soluções e oportunidades. Isso significa assumir as rédeas da própria vida e não ser um espectador da sua carreira.

Sem dúvida, se autodemitir é um fenômeno que vem ganhando força em todo o mundo, seja pelo objetivo de buscar uma vida com mais propósito, empreender e abrir o próprio negócio, ou por motivos pessoais como se dedicar somente aos filhos. Não importa. Seja qual for a razão, a autodemissão é uma decisão corajosa e necessária para alcançar os objetivos profissionais e pessoais.

*Deivison Pedroza é investidor, especialista em empreendedorismo e negócios e CEO da Way Minder

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